Capital Europeia da Cultura. E as periferias?

 

A convite da minha amiga Inês Bettencourt da Câmara (Mapa das Ideias) participei a 14 de abril num dos seminários do ciclo “Democracia Cultural e Participação dos Cidadãos”, iniciativa da equipa Oeiras 27 (capital da cultura). Um painel em boa companhia, com a Fátima Vieira (“Valongo cidade utópica”) e Ricardo Batista (“Onda Amarela”). A equipa “Oeiras 27”, seguiu-nos atentamente e foi colocando algumas questões a que espero tenhamos respondido. Aproveitei para dar uma ideia de algumas iniciativas simples que se podem desenvolver no contexto de uma capital da cultura, em lugares periféricos com populações mais excluídas, seguindo muito da experiência acumulada pela Laredo Associação Cultural.

Projeto "Embarca"- Bairro dos Navegadores, Oeiras

Se é certo que ser capital da cultura é um motor poderoso para o desenvolvimento, não é menos verdade que o debate preparatório, elaborando a candidatura, se constitui numa oportunidade ímpar para a reflexão sobre o território, com enfoque nos os seus habitantes. Naturalmente, a tendência será a de edificar e programar para atrair públicos de fora ao concelho para as propostas culturais, mas é importante pensar nos habitantes, sobretudo aqueles que vivem nos lugares menos acessíveis do concelho, o que habitualmente coincide com vizinhos de fraco poder económico e de poucos hábitos culturais. Trata-se de aproveitar a circunstância para contrariar as situações de exclusão provocadas pela teia urbanística caracterizada por uma miríade de bairros de alojamento prioritário, onde pontuam grandes aglomerados como na zona da Outurela. Destemidamente esclarecida, a equipa da proposta “Oeiras 27”, poderá propor uma Curadoria de Proximidade que procure, sempre que possível, trabalhar com as populações na criação artística in situ, de forma coletiva ou individual, levando em linha de conta as questões identitárias e a devolução final do produzido, partilhando com a comunidade durante um período de tempo que se quer feliz e que deixe a sua marca no âmago das pessoas. Ao envolver a população (os vizinhos) no processo artístico, enquanto atores e, também, fruidores espetadores com vista privilegiada para a intervenção cultural, estaremos a criar novos públicos, a semear apetências, construindo uma cidadania cultural. Ao convocar os vizinhos para esta aventura, estaremos a criar um sentimento de pertença, gerando qualidade de vida com reflexos na experiência escolar dos mais novos. O processo criativo conjunto, assente numa relação justa e verdadeira com os vizinhos, sem pressa e de escuta ativa das opiniões da comunidade, contribuirá para a serenidade social e crescimento interior dos intervenientes. Os artistas convocados para esta tarefa deverão ter um perfil humano profundo, pois poderão ter de assumir uma atitude de mediação, construindo equipas, gerindo vontades com reciprocidade e dialogando com os mediadores que já exercem o seu trabalho localmente, através das estruturas camarárias, Fundação Aga Khan Portugal, em juntas de freguesia ou associações locais. Neste contexto, faz sentido fazer uma programação imaginativa, de proximidade com as pessoas que habitam os diferentes lugares do concelho, apresentando propostas transversais, com cruzamento de linguagens e possuindo diferentes níveis de exigência, sempre com o cuidado de realizar uma mediação cultural que aproxime os novos públicos dos conteúdos. Concomitantemente, é interessante convidar artistas próximos das identidades culturais presentes em Oeiras, possuidores de discursos criativos atuais. Para uma tarefa desta dimensão, conta-se com a presença dos serviços educativos das diferentes estruturas culturais existentes; dos museus aos lugares de património, passando pelas bibliotecas que possuem uma rede espalhada pelo concelho. No caso das Bibliotecas, “Oeiras 27”constitui-se como oportunidade única para apoiar a criação de novos serviços de extensão bibliotecária e reforçar a oferta já existente. A capital da cultura poderá deixar no terreno pequenas estruturas culturais como ludobibliotecas e reforçar a oferta já existente, camarária ou de outra origem. Mas, para além do edificado, importa pensar na sustentabilidade das propostas, garantindo e gerindo recursos humanos que deem continuidade à presença cultural nos diferentes bairros. Esta preocupação estende-se ainda à capacitação de jovens mediadores culturais que ficariam responsáveis localmente da disseminação de propostas e gestão dos espaços não camarários, referidos anteriormente. A mobilidade gera proximidade dos lugares de cultura e reduz as distâncias subjetivas entre o centro e as periferias; neste sentido, um serviço municipal de transportes colocado ao dispor da mediação para a cultura pode ter efeitos surpreendentes. A cultura e a mediação cultural geram qualidade de vida nos locais de intervenção, tendo reflexo no percurso escolar dos habitantes mais novos.

"(...) Estes eixos refletem a ambição deste projeto que vai muito para além da candidatura a Capital Europeia da Cultura, porque é um projeto que aposta na Cultura, nas Pessoas e no desenvolvimento de Oeiras"

Jorge Barreto Xavier, comissário da candidatura

#Oeiras27






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