"A cor das histórias" no Linhó - A leitura faz o seu caminho

Finalmente começam a chegar respostas aos meus desafios: poemas escritos e ilustrados pelos reclusos. De vez em quando temos que trabalhar a escrita a partir da língua materna dos participantes; começamos com o poema em Crioulo e todos ajudam a traduzir para Português – ficam espantados com o poder das palavras numa língua que dominam mal… Dão bom uso aos cadernos e canetas que ofereci… No grupo há um jovem Colombiano que se farta de ler… Ontem levou um livro de Luís Sepúlveda (“Expresso da Patagónia” ); já lamentámos não ter um livro de Garcia Lorca para ler aos outros reclusos.  A biblioteca vai melhorando – o recluso faxina está a organizar os livros segundo a CDU - vai ser muito mais fácil encontrar o que procuramos. Passou a ficar uma lista de recomendações de leitura junto deste “bibliotecário” acidental, com indicações precisas da pessoa a quem se destina determinado livro.  As pessoas do exterior, bem-intencionadas, por certo, continuam a oferecer às prisões livros obsoletos e pouco interessantes para esta população específica. Diz-me o faxina bibliotecário: “Ó professor…quem vai ler este livro do Lenin ou o “Anuário da Marinha”? Concordo, ninguém. Mas no meio da doação encontro algumas pérolas, já gastas – um livro de Gedeão encontrou logo um leitor. As minhas propostas de leitura vão fazendo o seu caminho no pequeno grupo com hábitos de leitura mais enraizados: Italo Calvino (“O visconde cortado ao meio” – lembrei-me logo da Helena Gravato) e Nicolai Gógol (“O retrato”). Este trabalho de mediação leitora em contexto prisional necessita de mais tempo para se desenvolver. Consegui que o um dos reclusos lesse em voz alta dois poemas de José Fanha (Antologia) – O Fanha faz milagres neste contexto… Outros autores lidos na sessão: Álvaro Magalhães, Ondjaki (“os da minha rua”) e, de novo, Alexandre O’ Neill (muito apreciado nesta comunidade de leitores). Encerrando a sessão, um livro de imagens de David Wiesner (“Tuesday”) fez as delícias dos presentes.
Poema escrito e ilustrado pelo Nilson. Há muitos cadernos com escrita escondidos nas celas.

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