"Leituras diferentes" no agrupamento da Rinchoa e Fitares
Explorando o "Popville"
Mediação leitora e necessidades educativas especiais
Pegar no livro, segurá-lo bem, mostrar cada parte que o
compõem: capa, guardas, páginas e contra capa. Usar o livro de imagens com
calma, sabendo que queremos chegar bem próximo de jovens com necessidades
educativas especiais. Não são profundas as limitações que aparentam mas bem
variadas, exigindo uma resposta individual no contexto do coletivo. O confronto
com a mensagem do livro ajuda a definir onde falta a peça, onde é preciso
trabalhar. Importa lembrar sempre, que antes de cada deficiência existe uma
personalidade e um estádio da vida: criança, pré-adolescente, adolescente ou
adulto. A personalidade é sempre determinante na vontade de apreender a
narrativa de um livro. Falo dos jovens da sala SAF do agrupamento de escolas
Escultor Francisco Santos (Fitares-Sintra), do projeto “Leituras diferentes”.
É dia de mediação do livro e da leitura e já escolhi três
livros para trabalhar com serenidade, esperando recolher no final, uma bela
coleção de palavras, reflexo das leituras que fizeram na manhã.
“O que cabe dentro de um livro?” – Pergunto, mostrando
“Popville”, uma publicação pop-up (ver link, mas o melhor é mesmo manusear o livro). Será que a Rinchoa (local de
origem destes jovens) cabe toda dentro de um livro? Olhares incrédulos e
comentários surgem na sequência da pequena provocação. Depois começo a folhear:
“Era uma vez uma aldeia chamada Rinchoa que foi crescendo, crescendo … até se
tornar uma grande cidade”. No final da narrativa está o livro todo aberto com
as suas 3 dimensões, com uma grande cidade nascida das suas páginas. A
professora Fernanda pega na deixa e fala da tridimensionalidade com um discurso
adaptado. Aliás, é comum esta técnica de eco, repetição ou tautologia, para
ajudar à interiorização de novos conceitos, por parte dos professores, técnicos
e mediadores que trabalham com necessidade educativas especiais. Uma espécie de
momento pedagógico que se aproveita informalmente.
Passo para o livro seguinte: “Zoom”. Neste livro
trabalhamos a memória leitora e a antecipação leitora, num exercício de
constante concentração preceptiva. Costumo estabelecer uma espécie de
competição para que os sentidos fiquem alerta. Destaco a importância do olhar
focado na leitura dos livros. Importa saber ler os “bonecos”! A mediação do
livro é feita num círculo onde todos têm o direito à palavra, valorizando-se as
aquisições vocabulares: assim, se alguém diz uma palavra nova, esta é repetida
para que todos a sinalizem. Sucedem-se as páginas em jeito de adivinha. O
mediador vai apelando à memória iconográfica dos participantes, sem pressa e
sentindo o movimento global do grupo em direção ao entendimento. Existem sempre
interrupções na mediação do livro: cada participante tem o seu modo próprio de
estar e expressa o entendimento do que assistiu com assinatura própria…nunca é
inconveniente.
O último livro da sessão foi “A onda” de Suzy Lee (link). Os
princípios acima enunciados são os mesmos que se aplicam nesta mediação.(Estimular
a oralidade narrativa, a memória leitora/iconográfica e a antecipação leitora…)
No entanto, trabalhar “A onda” com este grupo específico de jovens apresenta
algumas particularidades que vale a pena mencionar:
- Os leitores fazem uma ligação afetiva com as gaivotas do
livro que funcionam quase como um coro grego, sublinhando as mudanças
narrativas. Um ponto a explorar.
-A dobra (entre página par e página ímpar - onde a onda
rebenta) domina o livro e é determinante na construção da narrativa, caminhando
em paralelo com o tema – uma ida á praia. Costumo apelar à memória do vivido
perguntando: Qual foi a última vez que foste à praia? Esta praia faz-te lembrar
outra que conheceste? Sabem que faço coleção de conchas? Uma vez fui à praia e
tive medo do mar…
- A amizade de uma criança com uma onda abre um campo de
afetos com uma não pessoa. Por vezes é mais fácil que uma criança projete as
suas afinidades com um elemento da natureza: um bicho, uma árvore ou…uma onda.
(Veja-se o sucesso das fábulas e outros livros com animais, junto das crianças...)
- A exploração do objeto livro é muito interessante com esta
obra de Suzy Lee. Acontece por vezes, que os jovens com perfil autista ficam
fascinados com a dobra do livro e com o efeito que a narrativa tem sobre a
configuração final do livro. Ainda da mesma autora é bom que se conheça
“Espelho” e “Sombras”
No final da sessão, fazemos uma coleção de palavras para
cada um dos livros apresentados, fixando, assim, os conteúdos.
É importante que, encerrando a intervenção, a professora
bibliotecária disponibilize os livros para empréstimo domiciliário. Este gesto
é muito significativo para estes jovens, responsabilizando-os sobre o livro,
fidelizando-os ao espaço de leitura dentro da escola.
Para a semana, há mais…
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