Pedra de Fundear
Continuando esta tarefa de atualizar a informação aqui no blogue, faltava partilhar o texto de sala que acompanhou a instalação/desenho Fundear, que teve lugar em Dezembro de 2025 no Museu de Vila do Bispo e que terminou com a aquisição da peça, permitindo a sua visualização regular, integrada na coleção permanente no belo “Celeiro da história”. Foi um momento importante do meu trabalho como pintor e também como apaixonado pela linha de costa e território dos concelhos de Vila do Bispo e Aljezur. O texto que escrevi tem uma intenção pedagógica (a pensar nas escolas e não só...) ao propor um mergulho na obra a partir de uma história simples e verdadeira que acabou por servir, também, para homenagear tantos que no seu dia a dia trabalham no laredo (linha de costa rochosa, zona entre-marés). É evidente a minha afinidade com este belo Museu do Barlavento Algarvio; como se esta exposição fizesse parte das minhas expedições adolescentes ao território mítico de Sagres. Fica aqui um abraço especial para Ricardo Soares e outro, muito reconhecido pelo desafio, para Ana Celorico Machado.
Quando era criança, lembro-me de ficar fascinado com uma pedra de fundear que havia no "Sabiá", o barco do meu Tio, lá na praia do Vau. Uma âncora de pedra cheia de buracos por onde passava o cabo que a unia a embarcação. E perguntava: "Tio esta pedra já vinha com buracos?" E ele respondia. "Sim. Trouxe-a de Sagres. E fiquei-me com aquela, uma pedra vinda de um lugar mítico como Sagres... No dia seguinte, fui espreitar lá na praia a embarcação de um primo. E lá estava outra pedra com buracos. Pensei. "Também veio de Sagres". ..
Passados muitos anos na calheta da Arrifana, o Senhor António da Glória explicou-me pacientemente que o aparato de cimento e ferro que tinha acabado de inventar, para fundear o meu barco aos fundos, corria o sério risco de se prender de tal forma às rochas que, o mais certo era ficar lá tudo, cabo incluído. E acrescentou. "Estes fundos são de grandes arrifes e fendas que prendem qualquer âncora. O melhor é arranjar uma dessas pedras com buracos. Se ficar demasiado enrocada, dá-se um cheirinho avante com o motor e ela solta-se." E onde arranjo uma?”...
Lá fomos estrada fora, rumo a Sagres, em demanda da minha pedra de fundear. Ao chegar à Raposeira seguimos por um caminho ermo de terra batida. Parámos o carro e seguimos campo fora, espreitando em cada afloramento calcário, revirando pedras, até encontrar a âncora de pedra correta para a minha embarcação. Carregámos a escolhida e seguimos de volta para Aljezur.
Pensei: "Afinal é aqui em Vila do Bispo que nascem as pedras..."
Comentários
Enviar um comentário