Museu do Dinheiro e a árvore das patacas

Euro com raízes - Escultura - Miguel Horta - Moeda, solda e latão


Meio encurvado, um homem segue ao longo do corredor, com uma caixa debaixo do braço, olhando calmamente as vitrines repletas de moedas. Nisto, cai-lhe uma moeda, talvez do bolso. Tilinta no chão, rodopia e para. Um diligente visitante apressa-se a recolher a moeda do chão, entregando-a ao homem que sorri:
-Está a ver, meu caro senhor? Nem deu tempo para ela criar raízes.
O visitante olhou-o baralhado.
Continuou o homem.
-Sim! Toda a gente apanha as moedas do chão, nem dando tempo para que se crie uma pequena raiz ... Como há-de germinar a moedinha? Com paciência, com tempo, fazemos crescer uma “árvore das patacas”...
Depois o homem pega na caixa que leva consigo e abre-a cuidadosamente mostrando o seu interior ao curioso visitante. Está cheia de terra, mas bem no meio, brilhando, desponta uma moeda. Delicadamente, vai puxando pela moeda e vão surgindo raízes douradas agarradas à peça de metal. Diz o estranho homem, sob o olhar divertido do seu interlocutor:
- Esta esteve 200 anos debaixo de terra e já está pronta para ser plantada... Agora é preciso encontrar um terreno fértil onde possa medrar. 
Miguel Horta, abril 2019


Assim começaram os contos que apresentei no Museu do Dinheiro, a Convite de Sara Barriga - “Quem conta um conto...”. Nesta aventura também estavam outros belos colegas de narração: António Fontinha e Ana Sofia Paiva. Aos três foi proposto que escolhessem contos da tradição oral portuguesa que abordassem o tema do dinheiro, das moedas. Cada um pesquisou a seu modo e, ao longo de seis apresentações individuais, em diferentes espaços do museu, partilhámos as narrativas a 13 de abril e 19 de maio. Foi um desafio fantástico! Escolhi para as primeiras 3 sessões um conto da ilha de S. Jorge, “O filho do pescador”, abrindo a narrativa cantando “Rema”. A 19 de maio apresentei um conto, que escrevi entretanto: “O dote” ou “quantas vacas vale uma mulher?”. Uma narrativa que começa na ilha do Fogo cerca de 1470, com um jovem Português, Cabo-verdiano, Crioulo, Capitão de embarcação que vai trocar fardos de algodão por escravos à costa da Guiné, acabando por se casar com uma jovem Mandinga, tornando-se um Lançado (tangomao), feliz na sua tabanka. As sessões começaram sempre com a brincadeira da moeda. Foi com muito gosto que pesquisei e dei voz ao filho do pescador e fiz surgir João Tomé, mais conhecido por Djon di Guiné. Mais duas personagens que entraram para o meu reportório. Obrigado à Ana Rita Canavarro que nos acompanhou sempre ao longo deste desafio.

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