A ilha do Amor - Museu Gulbenkian

Último texto, num total de três, que aqui se publicam, referindo obras do Museu Gulbenkian, Coleção do Fundador, nasceram de um desafio que me foi lançado para criação de suporte escrito para áudio-guias. Agradeço este interessante desafio, apesar de ainda não se ter concretizado. Deu-me oportunidade de estudar, e de apresentar um ponto de vista vivo sobre a coleção, escrevendo interpelações a cada visitante. Aqui vos deixo esta pequena viagem pelos olhos de um pintor/mediador.

Festa em Rambouillet ou A Ilha do Amor
Jean-Honoré Fragonard ; (1732-1806) ; França; c. 1770; Óleo sobre tela

Deixemos que o olhar deambule por esta pintura a óleo de Jean-Honoré Fragonard, repleta de estímulos visuais, gerando a sensação de conter um secreto mistério que nos obriga a vaguear pela poderosa floresta retratada, procurando um sentido para a obra. A atmosfera misteriosa adensa-se em recônditos escuros; no meio do arvoredo denso que domina quase toda a tela, uma árvore nua ergue os seus ramos rasgados em direção ao céu; outra parece assumir as formas de um torso de mulher. Uma outra figura feminina aparece recortada pela luz, sem se deixar identificar, talvez assinale o lugar onde se forma um rio caudaloso que se precipita em cascata sobre o mar. Quem são os passageiros elegantes que chegam em barcos de passeio à foz do pequeno rio? Talvez venham para uma festa… Outro grupo, quase engolido pelo constante jogo do claro e do escuro, desce uma escadaria, observando as águas. A paisagem natural é transfigurada por uma cenografia fantasiosa, quase anunciando o Romantismo ,dominando o nosso olhar incauto ao percorrer o quadro. Provavelmente, o essencial não é visível... Acredita-se que Fragonard não procurou representar nenhum lugar específico nesta abordagem Rococó ao tema da Festa Galante, neste caso campestre, apenas deixou fruir a sua gramática pessoal na representação da natureza. Calouste Gulbenkian adquiriu esta pintura em 1928 e, dois anos mais tarde, comprou outra com o mesmo tema da Festa Galante, de Nicolas Lancret, que para além de revelar uma intencionalidade colecionadora, permite ao visitante estabelecer um contraste entre dois estilos plásticos distintos.

"Festa Galante",Nicolas Lancret, Museu Gulbenkian

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