A Fada das Cartas
Certo dia, no Moinho da Juventude a Rita Pedro que desenvolvia um importante trabalho de filosofia com as
crianças do Bairro, propôs ao grupo de crianças com quem refletia que escrevessem as
suas perguntas importantes numa carta que seria agarrada a um balão; este
seguiria livremente o seu rumo até encontrar alguém que respondesse
convenientemente às questões… A largada de balões deu-se no dia de aniversário da Associação.
Lembrei-me de introduzir uma personagem para mediar as
perguntas: a Fada das Cartas. Esta ficaria encarregue de responder às crianças,
por carta, dirigida a cada uma delas, e assim continuar a reflexão,
aprofundando-a cada missiva.
Infelizmente, nunca chegámos a enviar a carta às crianças… a
vida da Rita seguiu outro rumo, na direcção das fajãs de Santo Antão.
Como homenagem ao bom trabalho que se pode fazer nos “bairros”,
aqui fica o esboço da carta da “Postalinda”:
Queridos amigos e
amigas da Cova da Moura,
Estava eu recostada a dormir uma
bela soneca numa bela nuvem branca e fofinha, quando fui acordada por um balão
que flutuava colado ao meu nariz. Devo dizer que nunca fui acordada por um
balão, muito menos com uma carta agarrada a ele, na ponta de um cordel. Acordei
com a comichão do balão a roçar o meu nariz e logo quis ver o que vinha na
carta...
Mas logo a seguir chegou outro
balão e mais outro, uma multidão de balões com cartas agarradas a fios,
flutuando mesmo na frente da minha pequena nuvem azul clarinha. Tanta carta
para ler!... Logo eu que sou muito preguiçosa para ler e para responder. Mas
como tinha que dar resposta, senão levava um raspanete da Fada Madrinha, que é
a chefe por aqui, agarrei-me ao trabalho de leitura das vossas cartas, ajudada
pela beleza dos desenhos que me enviaram.
Vocês escreveram sobre coisas bem
difíceis:
-O Amor, a Vida, a Morte...e mais
coisas...
Experimentem lá a fazer as mesmas
perguntas aos crescidos! Aposto que nenhum deles vai dar uma resposta em
condições. O que vale é que eu tenho uma varinha mágica: sabe tudo! Dá resposta
a coisas que eu não sei... E até me dá respostas antes de eu perguntar. E esta?
-É mesmo mágica, a minha varinha...embora
eu não saiba dela. Sabem, sou muito distraída.
Dizem que as fadas resolvem tudo.
É certo que umas tais três fadas resolveram a história daquela rainha que não
podia ter filhos: lá engravidou, mas o
miúdo nasceu com orelhas de burro...ninguém é perfeito, enfim…Nem sequer as
fadas. Mas lá resolveram a coisa, e no final o príncipe já sem orelhas de asno
acaba por casar com uma bela miúda.
Também na Bela Adormecida as
minhas colegas fizeram um bom trabalho. Igualmente, com o mentiroso do
Pinóquio, elas tiveram muito sucesso e o rapaz, que era um tretas, acaba por se
safar da baleia, dando grande alegria ao velhote Gepeto.
Agora quanto às vossas questões,
como é que vou responder se perdi a minha varinha de condão, a tal que dá
respostas boas respostas, numa dessas nuvens passageiras que por aqui andam
cheias de pressa em chover?
Mas porque é que eu sou tão desarrumada e
distraída? Nem sei em que nuvem deixei a minha varinha…
Pois é... Terão que se contentar
com a minha opinião de jovem Fada das Cartas; as mais crescidas deram-me esta
tarefa... E tenho as cartas todinhas na minha frente!
Mas prometo que vou fazer o meu melhor. Afinal
sou uma Fada! Quer dizer...mais ou menos da vossa idade, mas sou mágica...
No próximo
balão, não me podem mandar a pergunta mais bem explicada? É que eu tenho de entender muito bem aquilo que me perguntam...
Fico aqui à espera da vossa
próxima carta voadora com apetite de leitora.
Entretanto vou procurar a varinha
no meio do céu nublado, para vos poder responder como deve ser.
Beijos mágicos da Postalinda (é
como as fadas crescidas me conhecem...)
Escrevam, não se esqueçam.
Foto de Rita Pedro (sessões de Filosofia com crianças)
Comentários
Enviar um comentário